MILITARIZAÇÃO DA POLÍTICA BRASILEIRA: O GOLPE DENTRO DO GOLPE ?

Luã Reis – Desde o golpe de 2016, houve uma crescente militarização da política brasileira:

– No primeiro dia do governo Temer, 12 de maio de 2016, recriou-se o Gabinete de Segurança Institucional, que fora extinto por Dilma, nos moldes do Serviço Nacional de Informação, da época da ditadura militar. O chefe do GSI é o General Sérgio Etchegoyen, cuja família de militares sempre se participou da política desde a década de 1920. O General Etchegoyen foi o primeiro militar da ativa a atacar a Comissão da Verdade como “leviana” e “covarde”.

– Antes do golpe, o General Mourão foi afastado, por Dilma, do Comando Militar do Sul por defender o torturador Brilhante Ulstra. Em 2017, reaparece a cena pregando a “intervenção militar constitucional” em um evento da maçonaria, afirmando que os militares estão prontos para agir “caso a crise fuja do controle”

– O comandante do exército, General Villas Boas, considerado o “democrático” e “progressista”, confirmou as declarações de Mourão, descartando qualquer punição ao general. A partir daí, vários oficiais de menor patente declararam apoiar Mourão e estarem prontos para agir.

– Na véspera do Ano-Novo, em 30 de dezembro de 2017, o governo do Rio Grande do Norte entre a Secretaria de Segurança Pública para o exército para “garantia da Lei e da Ordem”.

– Em 25 de janeiro de 2017, o exército começa uma série de operações em Roraima. Poucas semanas depois o Secretário de Estado do EUA, Rex Tillerson, conclama os países sul-americanos a derrubar militarmente o governo Maduro.

– Em 14 de fevereiro, Temer dobra o efetivo militar em Roraima, incluindo a presença de blindados estacionados em Manaus.

– Depois do Carnaval, 16 de fevereiro, Temer decreta a intervenção militar na segurança pública do Rio de Janeiro. Todos os órgãos de segurança do segundo Estado mais importante e terceiro mais populoso da federação ficam a cargo do exército.

– Generais, da reserva e da ativa, vão a público defender que a intervenção militar no Rio de Janeiro tem mecanismos jurídicos específicos. O “legalista” Villas Boas exige “garantias” que os militares não enfrentarão “nova comissão da verdade” pelo que vão “enfrentar no Rio de Janeiro que pode provocar mortes de inocentes”. O General Heleno, da reserva, exigiu “regras de engajamento flexível” para os militares “que possibilitassem a eliminação de pessoas com atos ou intenções hostis sem nenhuma consequência jurídica aos militares”.

– Em 26 de fevereiro de 2017, Temer entrega o comando do Ministério da Defesa a um militar, o General Silva Luna. O general é o primeiro a assumir a pasta, que centraliza o comando das Forças Armadas, desde que foi criada em 1999. O comando das Forças Armadas não mais pertence aos civis. 
O governo Temer, fraco, golpista e ilegítimo que assaltou o poder colocou em menos de dois anos os militares no centro da política brasileira. Cabe a comparação com um vizinho: em 1972 Juan Bodaberry foi eleito, através do voto, presidente do Uruguai, no ano seguinte chama os militares para participar do governo. Diferente dos outros países do cone sul, Brasil, Argentina, Chile e Paraguai, nesse momento não houve um general no poder. No entanto quem mandava de fato no país eram os generais com Bodaberry sendo uma figura decorativa, afirmando que o “governo era civil militar”. No governo Bodaberry, fechou-se o congresso, proibiu-se os partidos políticos, o Uruguai foi ativo na operação condor, houve desaparecimentos, torturas e mortes de inimigos políticos. Bodaberry foi substituído pelo vice, um civil também, por ordem dos militares. Apenas em 1981 um general assumiu o poder, já na fase final da ditadura.

No documento fundamental do golpe, o áudio da conversa entre Sérgio Machado e Romero Jucá, o senador diz “estou conversando com os generais, comandantes militares. Está tudo tranquilo, os caras dizem que vão garantir. Estão monitorando o MST, não sei o quê, para não perturbar.” Em três linhas, Jucá diz que: os militares garantiram o golpe; espionam o “inimigo interno”, o MST; mas também, há algo mais, não especificado, na ação do comando militar, o “não sei o quê”.

Os militares não são peças de um jogo de tabuleiro, manipuláveis e removíveis, são historicamente ativos na vida política brasileira. A corporação lê e compreende o momento ativamente. Em segundo plano desde a constituição de 1988 – texto no qual impulsarem a possibilidade de “intervenção” – retomam o protagonismo perdido desde o fim dos anos 80.

A justificativa oficiais, e divulgados pelo aparato midiático, a crise de segurança ou a crise humanitária só fazem sentidos se observadas isoladamente. Em conjunto a proeminência política de militares deve ser entendida como uma ação planejada, um grave risco a capenga democracia, francamente assustadora para qualquer organização civil, popular e livre. Seja se for próximo armado um novo 1964, uma ditadura civil-militar à uruguaia ou o “não sei o quê” que já contaram ao Jucá.

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