Hoje na História: Quebra de Xangô, o racismo e a intolerância religiosa em Alagoas

Via EsquerdaOnline

Hoje comemoramos o dia dois de Fevereiro. Dia de Iemanjá, a Rainha das Águas. Orixá de origem iorubá que têm devotos e admiradores por todo o país. O dia 02 de Fevereiro é um dia de festa para os adeptos das religiões afro brasileiras, mas não só para estes. Em diversas cidades do Nordeste, como Salvador, Maceió, Natal, entre outras, o dia 02 é um dia de alegria, festejo, comunhão e de respeito entre as diversas religiosidades, entrando no calendário de festividades destas cidades.

Porém, o dia 02 de Fevereiro também marca o oposto, que foi um dos capítulos mais cruéis e violentos quando se fala de intolerância religiosa no Brasil, a Quebra de Xangô.

Em 1912, em Maceió, na noite do dia primeiro de Fevereiro, uma organização paramilitar, chamada de Liga dos Republicanos Combatentes, criada por Fernandes Lima (foto), um político de oposição ao então governador Euclides Malta, invadiu e destruiu os terreiros da cidade. Fernandes Lima não foi condenado pela ação, muito pelo contrário, o mesmo viria a se tornar vice-governador, deputado federal e senador durante os anos seguintes, e hoje dá nome à principal avenida da capital alagoana. É importante apontar que governador na época, Euclides Malta, professava a fé católica, porém tinha uma relação de bastante proximidade com os povos do terreiro, em uma relação de liberdade religiosa que incomodava o setor mais conservador da elite do estado.

"Tia Marcelina" - Quadro de Mestre Zumba. Tia Marcelina, com mais de 80 anos de idade, foi assassinada com golpes de sabre, socos e pontapés durante o Quebra de Xangô.

Assim, na noite do primeiro dia de fevereiro a Liga dos Republicanos Combatentes realizou seu ataque, destruindo e queimando centenas de terreiros na cidade. Diversos pais de santos e líderes religiosos foram espancados, outros fugiram para os estados vizinhos como Bahia e Pernambuco com medo da morte. A mãe de santo Tia Marcelina foi brutalmente assassinada no ataque, e hoje seu nome e sua história são lembrados como símbolos de resistência negra.

Nenhum terreiro na capital conseguiu escapar, todos foram destruídos e os religiosos se sentiram amedrontados por conta de sua fé. Diversas expressões da cultura negra desapareceram após o ataque. Seja por medo de sua representação ou pelo fato da saída do estado de importantes lideranças.

A Quebra de Xangô foi a mais violenta ação contra povos do terreiro que se tem registro no Brasil. Durante as décadas seguintes os religiosos que ainda se mantinham, faziam suas preces e manifestações de forma silenciosa, o que ficou conhecido como “Xangô rezado baixo”, onde não se tinha os cantos, as danças ou os toques dos tambores. O medo de novos ataques, da repressão e da morte, contrastava com a força da fé, a religiosidade e a coragem de envolver os ritos com um véu de mistério e segredo, para que estes continuassem a serem realizados.

A ação de violência contra os povos do terreiro foi uma manifestação de intolerância religiosa e de racismo, onde além de buscar um silenciamento das manifestações do povo preto e pobre, tinha um ideal de embranquecimento da cultura e das manifestações religiosas aceitas socialmente.

Por isto é importante recordarmos deste acontecimento. O dia 02 de Fevereiro é dia de Festa e dia de Resistência. De lembrar quem somos, como chegamos até aqui e quem se foi antes de nós.

Odoyá, Iemanjá! Viva a Rainha das águas! Viva o Xangô rezado alto! Viva Tia Marcelina! Não vão nos calar!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *