16 conflitos ignorados pela mídia ocidental

Via Pagina12

O mundo inteiro é abalado pelas operações militares na Ucrânia, mas esta não é a única guerra em curso. Longe dos holofotes da mídia, há uma série de outras guerras em curso na África e na Ásia. O número anual de mortos é da ordem dos milhares.

O horror da guerra não descansa. O drama da guerra tornou-se habitual para aqueles que sobrevivem sob cenários dantescos, colagens infames nas quais a fome e a morte andam de mãos dadas dia e noite. O sol não precisa se pôr para que a escuridão venha: totalmente ignorados pela moral ocidental, em cerca de vinte lugares do planeta a população convive diariamente com guerras sangrentas.

Camarões

A Escola de Cultura de Pau ressalta que “as duas regiões anglófonas do oeste dos Camarões continuam sendo afetadas pelo grave clima de violência como resultado das ações dos atores secessionistas armados, bem como do uso excessivo da força e das operações de contrainsurgência realizadas pelas Forças Armadas e milícias locais”. A violência irrompeu em 2017. Segundo o Grupo Internacional de Crise, mais de 6.000 pessoas já foram mortas.

Etiópia (Tigray)

Em 2020, a região de Tigray na Etiópia foi afetada por uma escalada de tensão com o governo federal que levou a um confronto bélico com graves conseqüências. Em 4 de novembro daquele ano, o Primeiro Ministro etíope Abiy Ahmed ordenou o lançamento de uma operação militar contra as autoridades desta região fronteiriça com a Eritréia. A ofensiva foi seguida de fortes lutas e uma escalada do conflito, resultando no deslocamento de milhares de civis. A ONU advertiu que estava se desenvolvendo uma crise humanitária em larga escala.

Em novembro passado, o Presidente dos EUA Joe Biden disse que a Etiópia não atende aos requisitos de elegibilidade da Lei de Crescimento e Oportunidade da África (AGOA) “devido a graves violações dos direitos humanos internacionalmente reconhecidos”. “Estamos enfrentando um conflito aliado a uma economia em deterioração e choques climáticos que estão agravando a situação humanitária de mais de 26 milhões de pessoas”, disse Pilar Orduña, oficial humanitário da Oxfam Intermón.

Mali

Este país africano é o cenário de múltiplos atos de violência. Em seu relatório sobre os conflitos no mundo, Escola de Cultura de Pau destaca que o sofrimento em grande parte do território malihadista se deve a ações armadas perpetradas por grupos jihadistas, além de confrontos entre milícias das comunidades Fulani, Dogon e Bambara e confrontos armados entre as duas coalizões de grupos jihadistas da região, bem como as respostas não menos agressivas das forças de segurança. O horror já ceifou pelo menos 25.000 vidas desde 2012. De acordo com o ACNUR, 2,5 milhões de pessoas foram deslocadas de seus locais de residência como resultado desta situação dramática.

Moçambique (Norte)

Desde o final de 2017, a província de Cabo Delgado, no norte de Moçambique, vem sofrendo um conflito armado liderado pelo autodenominado Ahlu Sunnah Wa-Jama (ASWJ). A organização armada jihadista fez sua primeira aparição em outubro daquele ano com o ataque a três postos policiais no distrito de Mocimboa, na Praia. Desde então, Cabo Delgado tem sido o epicentro do aumento da atividade violenta no país. Médicos Sem Fronteiras advertiram recentemente que “a crise humanitária persiste e centenas de milhares de pessoas deslocadas estão sobrevivendo em condições precárias”.

Região do Lago Chade (Boko Haram)

A seita islâmica Boko Haram apela para o estabelecimento de um estado islâmico na Nigéria e considera as instituições públicas nigerianas como corruptas e decadentes. O relatório da Escola de Cultura de Pau adverte sobre a “persistência das atividades de Boko Haram, apesar das operações de contrainsurgência, causando novos deslocamentos de população e agravando a crise humanitária existente”, marcada por “violações generalizadas dos direitos humanos, incluindo massacres de civis, mutilação e seqüestro de crianças e violência sexual contra elas”.

Região Oeste do Sahel

A região oeste do Sahel (norte de Mali, norte de Burkina Faso e noroeste do Níger) é afetada por uma situação de instabilidade crescente que tem uma origem multicausal. Ela combina a existência de redes criminosas transfronteiriças no Sahel e a marginalização e subdesenvolvimento das comunidades tuaregue nômades na região, entre outros fatores. Isto é agravado pela expansão das atividades dos grupos armados do Mali na região fronteiriça com o Níger e Burkina Fasso.

“A situação se deteriorou drasticamente”, salienta Orduña. Na mesma linha, o documento da Escola de Cultura de Pau adverte sobre a “situação de instabilidade derivada da presença e expansão da insurgência jihadista argelina AQIM, sua fragmentação e configuração em outros grupos armados de natureza semelhante, alguns alinhados à Al-Qaeda e outros ao ISIS, que atualmente operam e se expandiram por toda a região”.

Desde a independência em 1960, a situação na República Centro-Africana (RCA) tem sido caracterizada pela contínua instabilidade política, levando a vários golpes de Estado e ditaduras militares. Há um confronto entre as elites políticas étnicas do norte e do sul que competem pelo poder e as minorias que foram excluídas do poder. “Os conflitos na região contribuíram para o acúmulo de armas e combatentes que transformaram o país em um santuário regional”, observa Escola de Cultura de Pau.

República Democrática do Congo (leste)

O conflito atual tem suas origens no golpe de Estado de Laurent Desiré Kabila de 1996 contra Mobutu Sese Seko, que culminou em seu poder de cessão em 1997. Posteriormente, em 1998, Burundi, Ruanda e Uganda, juntamente com vários grupos armados, tentaram derrubar Kabila, que foi apoiada por Angola, Chade, Namíbia, Sudão e Zimbábue, em uma guerra que custou cerca de cinco milhões de vidas.

O controle e a pilhagem dos recursos naturais contribuíram para a perpetuação do conflito e para a presença de forças armadas estrangeiras. A assinatura de um cessar-fogo em 1999, e de vários acordos de paz entre 2002 e 2003, levou à retirada das tropas estrangeiras e à formação de um governo de transição, seguido por um governo eleito em 2006. No entanto, este processo não trouxe um fim à violência no leste do país.

RDC (East-ADF)

O Allied Democratic Forces-National Liberation Army of Uganda (ADF-NALU) é um grupo rebelde islâmico liderado por combatentes ugandeses e congoleses que operam no noroeste do maciço de Rwenzori (Kivu do Norte, entre a RDC e Uganda). Originalmente, tinha entre 1.200 e 1.500 milicianos recrutados principalmente em ambos os países e na Tanzânia, Quênia e Burundi. É o único grupo da área considerado uma organização islâmica, e está incluído na lista de grupos terroristas dos EUA.

Somália

O conflito armado e a ausência de autoridade central efetiva no país têm sua origem em 1988, quando uma coalizão de grupos de oposição se revoltou contra o governo ditatorial de Siad Barre e três anos mais tarde conseguiu derrubá-lo. Isto levou a uma nova luta dentro desta coalizão para preencher o vácuo de poder, o que levou à destruição do país e à morte de mais de 300.000 pessoas desde 1991, apesar do fracasso da intervenção internacional no início dos anos 90.

Os vários processos de paz para tentar estabelecer uma autoridade central encontraram inúmeras dificuldades, incluindo queixas entre os diferentes clãs e subclãs que compõem a estrutura social somali, interferência da Etiópia, Eritréia e EUA, e o poder dos vários senhores da guerra. O Al-Shabaab continuou sendo a principal ameaça à segurança e estabilidade.

Sudão (Darfur)

O conflito de Darfur eclodiu em 2003 por demandas de maior descentralização e desenvolvimento da região por vários grupos insurgentes, principalmente SLA e JEM. O governo respondeu à revolta utilizando as forças armadas e as milícias árabes Janjaweed. A escala da violência cometida por todos os lados contra a população civil levou à possibilidade de genocídio na região, onde 300.000 pessoas já foram mortas desde o início das hostilidades, de acordo com as Nações Unidas.

A esta dimensão se soma a tensão inter-comunitária sobre o controle dos recursos (terra, água, gado, minas), em alguns casos instigada pelo próprio governo. A região de Darfur continuou a ser o epicentro da violência armada no Sudão.

Sul do Sudão

O acordo de paz de 2005 que terminou o conflito sudanês reconheceu o direito do Sul à autodeterminação através de um referendo. Entretanto, a cessação da guerra com o norte e a subseqüente conquista da independência do Sudão

Sul do Sudão

O acordo de paz de 2005 que terminou o conflito sudanês reconheceu o direito do Sul à autodeterminação através de um referendo. Entretanto, a cessação da guerra com o norte e a subseqüente conquista da independência do Sul do Sudão em 2011 não conseguiram trazer estabilidade ao sul. “As disputas sobre o controle do território, do gado e do poder político cresceram entre as múltiplas comunidades que povoam o Sul do Sudão, aumentando o número, a gravidade e a intensidade dos confrontos entre elas”, observa a Escola de Cultura de Pau.

Afeganistão

O país está em conflito armado praticamente ininterrupto desde a invasão das tropas soviéticas em 1979, quando a guerra começou entre as forças soviéticas e afegãs, por um lado, e os guerrilheiros anticomunistas islâmicos (mujahedin), por outro. O Talibã tomou o controle do país em agosto de 2021 sob o olhar destemido da comunidade internacional. A Frente Nacional de Resistência liderada por Ahmad Masood é agora o principal grupo armado contra o Talibã.

Mianmar

Desde 1948, dezenas de grupos rebeldes armados de origem étnica têm enfrentado o governo de Mianmar, exigindo o reconhecimento de suas particularidades étnicas e culturais e exigindo reformas na estrutura territorial do Estado ou da independência. As operações militares têm sido constantes durante estas décadas, e têm sido particularmente dirigidas contra a população civil, com o objetivo de eliminar as bases dos grupos armados, causando o deslocamento de centenas de milhares de pessoas.

“O número de deslocados internos em Mianmar desde a tomada do poder pelos militares em 2021 ultrapassou meio milhão de pessoas, chegando a cerca de 503.000”, diz um relatório do ACNUR publicado em 1º de março.

Iraque

O território iraquiano é outro cenário de violência crônica. Em dezembro de 2021, a missão dos EUA neste território chegou ao fim, marcada, como o Afeganistão, por outro fracasso: longe de viver em paz, o Iraque continua imerso em um panorama preocupante. A Escola de Cultura mantém este país na lista de lugares que sofrem de graves conflitos violentos.

Síria

“Os sírios têm sido submetidos a violações dos direitos humanos em escala maciça e sistemática”, lamentou o Secretário-Geral da ONU, António Guterres, na sexta-feira 11 de março. Suas palavras coincidiram com um novo aniversário da guerra que vem acontecendo no país desde 2011 e que tem envolvido o governo de Bashar al-Assad e grupos armados de diferentes inspirações.

Segundo dados do ACNUR, há 5,6 milhões de refugiados e 6,7 milhões de pessoas deslocadas internamente. A guerra também se traduz em outro número chocante: 80 por cento vivem na pobreza. “A situação humanitária é devastadora. Há mais de 13 milhões de pessoas necessitando de ajuda humanitária”, diz Orduña da Oxfam Intermón.

Iêmen

O Iêmen também é o cenário de uma grave crise humanitária causada pela guerra. Desde março de 2015, uma coalizão liderada pela Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos tem bombardeado áreas do país controladas pelos rebeldes Houthis. O último relatório da organização independente iemenita Mwatana for Human Rights afirma que ao longo de 2021 houve 839 incidentes de danos a civis e objetos civis nos quais mais de 782 civis foram mortos e feridos. “Mais de 80% do país precisa de assistência humanitária urgente”, diz Pilar Orduña. A morte se recusa a dar tréguas neste outro ponto crítico do planeta.

De acordo com dados coletados pela Escola de Cultura de Pau de Catalunya, existem atualmente 17 graves conflitos abertos no mundo.

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