A DIREITA E A MÍDIA TRADICIONAIS CRIARAM O DISCURSO BOLSONARISTA NA ONU

Por Luã Reis

O bolsonarismo não chegaria ao poder sem o apoio total da direita tradicional e da mídia que vocaliza esses interesses. Agora na disputa pelo poder esses campos se afastam, embora se aproximem naquilo que importa, isto é, as pautas econômicas. No entanto, o bolsonarismo apenas reverbera o que a direita tradicional já declarava na campanha histérica contra o PT e partidos de esquerda.

Cada elemento do discurso de Bolsonaro na ONU é uma reverberação daquilo que os grandes jornais publicavam e as cadeias de rádio e TV hegemônicas transmitiam. Com destaque para a atuação da Globo, emissora que aparece agora como “apoiadora na economia, mas opositora nos costumes”.

O PT, partido de esquerda, mas longe de ser socialista, era retratado pela mídia como uma extrema-esquerda ultra radical, logo, em consonância, Bolsonaro declarou que “os presidentes socialistas que me antecederam”. Capas da veja falavam do PT utilizando imagens de Lenin e Marx. A Folha de São Paulo e o Estado de São Paulo declaravam que qualquer iniciativa de regulação mínima do espectro dos meios eletrônicos de comunicação seria o caminho para uma ditadura socialista. Já a Época, revista da Globo, preferia atacar o “bolivarianismo” dos governos petista.

Por isso Bolsonaro pode atacar os povos de Cuba e da Venezuela. Não foram poucas as mentiras contra o povo cubano lançados pela mídia nacional, como a famosa capa da Veja “sobre os dólares de Cuba” – que a própria revista dizia não haver provas – ou as “denúncias”, de cunho xenofóbico, contra o programa Mais Médicos que levava assistência médica a dezenas de milhões de brasileiros pobres. Veja, Folha e Estadão convocavam e apoiavam os “protestos”, alguns abertamente racistas, de milionárias cooperativas médicas, famosas pelo descaso com os doentes e a sonegação de impostos.  

Na última eleição presidencial, a campanha apoiada pelos grandes jornais paulistas, pelo “mercado” e, logo, pela direita tradicional – agora chamada de “centrão” –  era a de Geraldo Alckmin, do PSDB. O mote dessa campanha era “impedir o Brasil de virar uma Venezuela”. Em cada peça publicitária, o tucano se utilizava de capas desses jornais – Estadão, Folha e O Globo – e reportagens do Jornal Nacional para destilar o mais sórdido ódio contra o país vizinho.  

O racista apresentador do Jornal da Globo repetia mentiras e mais mentiras sobre a Venezuela. Quando Chávez sofreu a tentativa de golpe militar, a felicidade foi evidente. O racista da Globo anunciava que Chávez “brincou com a democracia” e que esta ressurgria na Venezuela, tal como celebrou na capa do jornal o Globo o golpe de 1964 no Brasil, com a manchete “ressurge a democracia”. Afinal não estava certo Bolsonaro quando afirmava na Globo que Roberto Marinho foi um grande defensor do golpe e da ditadura militar que torturou, matou e desapareceu com milhares de pessoas?

O chefão morto da Globo concordaria com a defesa da ditadura militar feita por Bolsonaro na ONU. Mas não só a família Marinho: o jornal da família Frias, a Folha de São Paulo, publicou uma ficha falsa da presidenta Dilma, com o intuito de justificar a horrenda tortura a qual foi submetida.

Quando Bolsonaro ataca o meio-ambiente e seus defensores, ele amplifica a campanha do “agro é pop” realizada pela Globo. A emissora, os grandes jornais e os partidos de direita tradicional se dedicaram nas últimas décadas ao ataque do MST, dos pequenos agricultores, dos índios, dos ambientalistas de uma maneira geral. A candidata a vice na chapa tucana, Ana Amélia, defendeu as chicotadas recebidas por integrantes do MST no Rio Grande do Sul.

(Como dito aqui: as “pedaladas fiscais” nada mais era do que crédito aos pequenos agricultores, contra isso que a direita tradicional golpista se levantou. Nesse momento, Bolsonaro era só um histérico surfando naquele onda)

Mesma nas pautas dos costumes, nas quais a direita tradicional busca se diferenciar da extrema-direita, a raiz se encontra nos meios de comunicação tradicional: não foi Bolsonaro que inventou o termo “kit-gay”, foi a Folha de São Paulo para atacar a campanha de Fernando Haddad para prefeitura de São Paulo. Essa é uma das origens do discurso “contra o politicamente correto” que Bolsonaro declarou na ONU.

Todos os articulistas, colunistas, comentadores, repórteres, apresentadores desses jornais e revistas atacam genericamente a “ideologia” dos governo petistas quando, por exemplo, defendiam o caráter nacional da Petrobras, que deveria ser voltado para o serviço da população. Enquanto os partidos da direita tradicional diziam ser a luta entre a ideologia e o cristianismo, como na campanha de Serra em 2010. Na ONU, Bolsonaro foi na mesma linha, falando que “a ideologia invadiu a própria alma humana para dela expulsar Deus”.

Enfim, todo o resto do discurso – a defesa das privatizações, a submissão total aos EUA, a defesa de Sérgio Moro e da “luta contra a corrupção” – foi uma invenção da direita tradicional, midiática e partidária, que criou os consensos que o bolsonarmismo apenas ampliou. Sem o arcabouço ideológico da mídia tradicional e dos partidos do “centrão”, cada elemento apresentado no discurso bolsonarista da ONU não teria eco, seria opaco, logo estéril.

Quando o mundo todo se escandaliza com o bufão patético que destrói o Brasil e ataca a população brasileira, cabe lembrar que Bolsonaro não foi um trovão no céu azul. Pelo contrário, ele é resultado do fogo que a direita tradicional botou no país com o golpe de 2016, atiçado pelos ventos das mídias tradicionais.

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