Um Rei anti-imperial
Por Luã Reis
Nesse último dia 23 de outubro, o Rei do Futebol fez 80 anos. Quando se fala sobre Pelé, invariavelmente se analisa a natureza do Brasil, da brasilidade e do próprio o povo brasileiro. Quantas figuras encarnam o destino nacional tão profundamente? Nenhuma figura política ou cultural tem esse alcance. Em comparação exemplar: os monarcas que imperaram no Brasil não representarem quanto o Rei. Pelé é muito maior para esse país do que os Pedros.
Maradona é Dios para nuestros hermanos, sem dúvida, ao cumprir o papel de encarnar o espírito da Argentina. Pelé está em outro patamar, no entanto. O Reino dele não se restringe ao Brasil, mas a todo Sul Global e as populações periféricas do centro do capitalismo.
O início da Era de Pelé, no Brasil, coincide com um momento político nacionalista e popular no Brasil. No mundo era o momento da descolonização, a vitória dos movimento anti-imperialistas na África, na Ásia e no Caribe. Nos EUA, começava a luta pelo fim da segregação racial e pelos direitos civis. Um homem negro retinto sendo o maior jogador de todos os tempos do esporte mais popular do planeta evidentemente só pode ter um sentido afirmativo a esse movimento internacional de emancipação.
Em A Geopolítica do Futebol, o autor francês Pascal Bonifice, coloca que em nenhum império a superpotência dominante contou com tamanha “adesão dos povos conquistas”, quanto o Brasil do Rei Pelé. Os súditos desse reinado alcançavam lugares como Haiti, o Iraque, a Nigéria, a Iugoslávia e a Guatemala. O sol jamais se punha naquele império anti-imperial brasileiro do futebol.
Eric Hobsbawm perguntou: “Alguém ao ver o Brasil de Pelé jogando poderia negar o caráter de arte?”. Pelé é o maior artista que existiu e existirá. O domínio sublime de todos os fundamentos e a capacidade de antevisão extraordinária tornam Pelé inquestionável até para aqueles que não viram ao vivo. Micheal Jordan fala, que quando jogava em alto nível, o tempo passa mais devagar para ele, isso é perfeitamente visível na arte de Pelé.
Há quem despreze Pelé por exigir dele um comportamento militante que ele nunca se propôs a ter. Pelé deveria ser impávido como Mohamed Ali. Campeão do mundo, Pelé foi recebido ora por JK, ora por Jango e depois por Geisel. Por algum motivo só essa última vez deve ser considerada quando se pensa os sentidos políticos de Pelé. Não basta os historiadores do futebol apontarem o fracasso do uso da político do futebol brasileiro e de Pelé pela ditadura. Os milicos golpistas não conseguiram se associar a um jogo popular que era a antítese de tudo que eram.
Como se não bastasse, certa classe-média, professorando um liberalismo de uma esquerda pseudo intelectualizada, consegue ainda estabelecer a responsabilidade de Pelé pelo racismo no Brasil. A Frequentemente, a contestação da magnitude de Pelé (“aquele outro é melhor”) é combinada com o ódio ao Brasil, o horror a tudo que é popular aqui e a responsabilização do povo pela própria exploração.
Pelé deve ser reverenciado como gênio e símbolo popular dos negros, da gente do Brasil e dos povos do terceiro mundo. Essas ideias arrogantes e análises mesquinhas que querem diminuir o papel de Pelé para os brasileiros, que o povo deve se envergonhar dele e que Pelé deveria ter tomado uma posição x ou y devem ser superadas. Pelé é insuperável.