ESPANHA X PORTUGAL: ENTRE A GERINGONÇA E A SUBMISSÃO
Luã Reis – Após o início, em 2008, da interminável crise da zona do Euro, Espanha e Portugal passaram a integrar o infeliz grupo de países em recessão que foram obrigados a aceitar as medidas de austeridade contra as populações, exigidas pela União Europeia, isto é a Alemanha. Junto com os outros países do sul da Europa que sofriam com a grave situação econômica formavam os PIGS: Portugal, Itália, Grécia e Espanha [Spain, em inglês].
Os planos de austeridade tiveram altíssimo custo social: milhares de espanhóis foram despejados de suas casas, resultando em suicídios em série; as aposentadorias na Grécia foram reduzidas à metade; houve dramáticos cortes na educação em Portugal. Desse desastre econômico e social emergiram novas organizações políticas com diferentes perfis.
Na Grécia, em 2014, o Syriza, partido jovem de uma esquerda dita radical, conquistou o governo e ameaçou sair da União. Porém, traindo o voto popular, aceitou jogar o jogo de Berlim, entrando na vala comum da história da submissão ao Euro. Mês passado, outro partido novo, também com apelo junto a classe média, alcançou o poder na Itália, o Cinco Estrelas. O futuro dos italianos passará por uma nova relação com a União Europeia. Mas nem Grécia, nem Itália estão nessa Copa do Mundo.
A partir de 2008, um expressivo número de imigrantes portugueses veio buscar trabalho no Brasil, se aproveitando da bonança da Era Lula. Dez anos depois, o caminho inverso ao da colonização é que prevalece, brasileiros invadem a Lusitânia em busca de melhores condições de vida. A inversão nas políticas de governo é a responsável pela mudança: antes o Brasil era governado pela esquerda, enquanto Portugal padecia com um governo de direita neoliberal que seguia a receita cruel da austeridade. Agora é o Brasil que sofre com o draconiano governo Temer, com cartilha contra o povo, enquanto Portugal experimenta, desde 2015, um governo popular que investe no bem-estar da população para alavancar a economia sustentavelmente. Os portugueses experimentam uma inédita coalizão de partidos de centro-esquerda com os de extrema-esquerda, incluindo até o Partido Comunista Português. Dado o exotismo da formação do governo, a coalização foi batizada de “geringonça”. Ironicamente, a geringonça portuguesa de esquerda autêntica atrai hordas de coxinhas verde amarelos.
Em 2011, as massas espanholas tomaram as praças do país. “Los indignados” buscavam uma nova organização político-social para o bipartidarismo capenga e estéril. Diferente dos lusos, próximos de italianos e gregos, os espanhóis impulsionaram a criação de um novo partido de esquerda, o Podemos. Prometendo horizontalidade e transparência, o Podemos conseguiu implodir o bipartidarismo, mas não conseguiu alçar ao governo, que permanecia nas mãos do conservador, com forte ranço franquista, Partido Popular. Isso até duas semanas atrás, quando acuado por escândalo de desvio de verbas e suborno, o Primeiro Ministro Rajoy foi deposto pelo parlamento, passando o governo ao “socialista” Pedro Sanchez, do PSOE.
O PSOE era a ala esquerda do regime bipartidário espanhol, não sendo considerado uma esquerda propriamente popular, no entanto, há tempos não liderava o governo. Sendo um governo com minoria no congresso, o Podemos pode se tornar o fiel da balança de Sanchez. O partido novo tem a chance histórica de empurrar a velha agremiação para a esquerda, no sentido das necessidades populares. Cabe a Sanchez observar que a submissão total às exigências da União Europeia trouxeram a tragédia social para os espanhóis e a catástrofe eleitoral para o partido.
O exemplo está do outro lado da fronteira. Portugal tem mais oferecer para Madrid do que os gols de Cristiano Ronaldo. A Espanha tem a chance de formar uma geringonça espanhola, um governo que reverta as medidas sociopatas de Rajoy, as quis em nada beneficiaram a combalida economia da nação ibérica. A Espanha é a quarta economia da Zona do Euro e tem problemas complexos que não existem em Portugal, tais quais as reivindicações por autonomia da regiões, sendo a mais famosa e problemática a Catalunha. Em anos recentes, a Espanha conseguiu reinventar o estilo de jogar bola, o Tik Taka, como de um relógio, influenciou todo o planeta. Basta olhar para da pátria de Cristiano Ronaldo, a terra da Luz, a Lusitânia. Se ouve o Tik Taka, o tempo de austeridade e submissão passou, é a hora de uma autentica geringonça espanhola.